Foi só durares nele.
Quando vivas
sem que o gozes, não vives.
Não pesa que ames, bebas ou sorrias,
Basta o reflexo do sol ido na água
de um charco, se te é grato.
Feliz o a quem, por ter em coisas mínimas
seu prazer posto, nenhum dia nega
a natural ventura
Ricardo Reis
segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
Pensamento do dia...
Nós, os humanos, temos essa horrível e maravilhosa capacidade de sofrer pelo que não existe. Somos neuróticos.
Rubem Alves
Rubem Alves
domingo, 27 de fevereiro de 2011
sábado, 26 de fevereiro de 2011
A música dançarina
Apanha o ritmo
sinto tão bem
sempre o número cem
e com muita coragem
sempre a mexer
sempre a sorrir
vem daí a correr
a dançar
e a cantar
Dá uma roda
sempre na moda
não te esqueças do amigo
que ele venha contigo
mistura-te
com a música
contenta-te
com a magia
e a alegria.
Ana Lisete Miranda (8 anos)
sinto tão bem
sempre o número cem
e com muita coragem
sempre a mexer
sempre a sorrir
vem daí a correr
a dançar
e a cantar
Dá uma roda
sempre na moda
não te esqueças do amigo
que ele venha contigo
mistura-te
com a música
contenta-te
com a magia
e a alegria.
Ana Lisete Miranda (8 anos)
Dissertação sobre uma boneca insuflável…
Quando te comprei
parecias uma boneca insuflável
que cabias no meu bolso.
Fazias tudo o que eu pedisse
e nunca querias nada em troca
a não ser que eu não ultrapassasse
os limites das tuas fantasias.
Agora, arvoras um ar de senhora
e começas a exigir
que te trate por baronesa
e já não te contentas
em fazer compras avulsas nos saldos
nas lojas da fancaria
nem com as viagens low cost, pagas a crédito,
às Caraíbas, onde uma vez tropeçaste com a porteira,
que mal cabia no seu biquíni à florinhas,
e o que te irrita é teres de te cruzar com ela
nas escadas, todos os dias,
antes de ires para o trabalho que inventaste
para alimentar o delírio das tuas grandezas.
Sonhas com uma piscina aquecida
na exiguidade das nossas duas assoalhadas,
viradas para os estendais da roupa das traseiras
e pedes-me para conquistar o céu
onde não há limites para todos os teus caprichos.
Alexandre de Castro
retirado do Alpendre da Lua
Morada...
Hei-de encontrar
uma morada eterna
que te mereça
porque foste bom
e foste mau
mas nunca foste povo
(ainda que os teus olhos
tenham ajoelhado)
e se não existir
então invento-me.
Maria José Meireles
uma morada eterna
que te mereça
porque foste bom
e foste mau
mas nunca foste povo
(ainda que os teus olhos
tenham ajoelhado)
e se não existir
então invento-me.
Maria José Meireles
Existir...
Escolheste
o fundo
do meu coração
como morada eterna
e agora
que a tua boca
e as tuas mãos
se calaram
para sempre
dás-me pontapés
como um filho
no ventre
que me obriga
a escrever,
a falar
e a existir.
Maria José Meireles
o fundo
do meu coração
como morada eterna
e agora
que a tua boca
e as tuas mãos
se calaram
para sempre
dás-me pontapés
como um filho
no ventre
que me obriga
a escrever,
a falar
e a existir.
Maria José Meireles
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
Notícia do que corre...
Ela perguntou:
se a vida me correr mal
dás-me abrigo?
Ele respondeu:
se a vida te correr mal
abrigar-te-ei.
E morreram
na esperança
de que a vida corresse mal.
Maria José Meireles
se a vida me correr mal
dás-me abrigo?
Ele respondeu:
se a vida te correr mal
abrigar-te-ei.
E morreram
na esperança
de que a vida corresse mal.
Maria José Meireles
Improviso para contornar a impaciência de Álvaro de Campos...
Um fósforo pode acender-se
no pavio da esperança
e apagar-se antes da chama
antes que arda
os comboios passam
e todos os cais são de saída
e de entrada
há multidões que viajam
na ilusão de um encontro inesperado
e que tropeçam apenas
no degrau do vento.
Ademar
no pavio da esperança
e apagar-se antes da chama
antes que arda
os comboios passam
e todos os cais são de saída
e de entrada
há multidões que viajam
na ilusão de um encontro inesperado
e que tropeçam apenas
no degrau do vento.
Ademar
domingo, 20 de fevereiro de 2011
Sapatos...
Há quem estime
a vida
como uns sapatos
novos
para usar
no dia do funeral.
Quando morrer
quero ir descalça.
Maria José Meireles
a vida
como uns sapatos
novos
para usar
no dia do funeral.
Quando morrer
quero ir descalça.
Maria José Meireles
Madrigal ao contrário...
Deixa
que caminhe
alegre e intensamente.
Quando estiver cansada
abriga-me
no teu vazio.
Maria José Meireles
que caminhe
alegre e intensamente.
Quando estiver cansada
abriga-me
no teu vazio.
Maria José Meireles
Improviso sobre uma inspiração de Brecht...
Hoje decidi submeter-me
a uma cirurgia plástica
para corrigir a memória
o excesso de memória
comprime-me a consciência
preciso de emagrecer
para voltar a dormir
todos os dias
recordo o louvor do esquecimento
de Bertolt Brecht
"a fraqueza da memória dá
fortaleza aos homens".
Ademar
a uma cirurgia plástica
para corrigir a memória
o excesso de memória
comprime-me a consciência
preciso de emagrecer
para voltar a dormir
todos os dias
recordo o louvor do esquecimento
de Bertolt Brecht
"a fraqueza da memória dá
fortaleza aos homens".
Ademar
sábado, 19 de fevereiro de 2011
Casamento
Há mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como "este foi difícil"
"prateou no ar dando rabanadas"
e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.
Adélia Prado
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como "este foi difícil"
"prateou no ar dando rabanadas"
e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.
Adélia Prado
Improviso para Sheherazade...
Concordância e saudades
dizes
e vias de extinção
não peças a nenhum deus
o livro de reclamações
nem o mapa íntimo
de todas as distâncias
escreve antes virtudes e rumores
no lugar da ausência
canções de amor talvez
cânticos celestiais
outros sonharão o vento
certamente
mas será ainda na perfeição
que nos guardaremos
como segredo.
Ademar
dizes
e vias de extinção
não peças a nenhum deus
o livro de reclamações
nem o mapa íntimo
de todas as distâncias
escreve antes virtudes e rumores
no lugar da ausência
canções de amor talvez
cânticos celestiais
outros sonharão o vento
certamente
mas será ainda na perfeição
que nos guardaremos
como segredo.
Ademar
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
Segue o teu destino...
Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.
Ricardo Reis
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.
Ricardo Reis
Elis Regina - "Atrás da Porta" - Ensaio - MPB Especial
(Obrigada Cristina. És linda!...)
Etiquetas:
Cristina Martins,
Elis Regina
Soneto de fidelidade
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure
Vinicius de Moraes
Composição: Vinicius de Moraes / Capiba
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure
Vinicius de Moraes
Composição: Vinicius de Moraes / Capiba
Improviso em forma de tango...
Movimentam-se na tela
como num palco maravilhoso
que só as nuvens adivinhassem
caminham dançam esvoaçam
entram e saem da tela
como de uma imagem em que nunca coubessem
e escrevem em todas as línguas
no regresso de todas as viagens
as mulheres a que me abandono
têm uma tela dentro delas
e são ainda mais perfeitas
do que o mistério que as conduz.
Ademar
como num palco maravilhoso
que só as nuvens adivinhassem
caminham dançam esvoaçam
entram e saem da tela
como de uma imagem em que nunca coubessem
e escrevem em todas as línguas
no regresso de todas as viagens
as mulheres a que me abandono
têm uma tela dentro delas
e são ainda mais perfeitas
do que o mistério que as conduz.
Ademar
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
domingo, 13 de fevereiro de 2011
Improviso para não agitar antes de usar...
Dia sim
dia não
dizes-me adeus
o estranho
é que não me lembro
de te ter conhecido.
Ademar
dia não
dizes-me adeus
o estranho
é que não me lembro
de te ter conhecido.
Ademar
sábado, 12 de fevereiro de 2011
Improviso para começar a reescrever o Génesis...
Hoje arrematei o universo
mas sem nada lá dentro
paguei a crédito
e ofereci deus como fiador
não importa qual
expediente milenar
criacionista
agora poderei dispor do universo
como quiser
infinitamente
digo
dar-lhe finalmente uma utilidade.
Ademar
mas sem nada lá dentro
paguei a crédito
e ofereci deus como fiador
não importa qual
expediente milenar
criacionista
agora poderei dispor do universo
como quiser
infinitamente
digo
dar-lhe finalmente uma utilidade.
Ademar
sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011
A bailarina
Bailarina, ilustração de Yuri Dyatlov.
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Não conhece nem dó nem ré
mas sabe ficar na ponta do pé.
Não conhece nem mi nem fá
Mas inclina o corpo para cá e para lá.
Não conhece nem lá nem si,
mas fecha os olhos e sorri.
Roda, roda, roda, com os bracinhos no ar
e não fica tonta nem sai do lugar.
Põe no cabelo uma estrela e um véu
e diz que caiu do céu.
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Mas depois esquece todas as danças,
e também quer dormir como as outras crianças.
Cecília Meireles
Hora de descuido...
Quando um dia morrer
vão simplesmente dizer:
valeu a pena
os pais terem nascido.
Maria José Meireles
vão simplesmente dizer:
valeu a pena
os pais terem nascido.
Maria José Meireles
CONFIANÇA
O que é bonito neste mundo, e anima,
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura …
E que a doçura
Que se não prova
Se transfigura
Numa doçura
Muito mais pura
E muito mais nova …
Miguel Torga
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura …
E que a doçura
Que se não prova
Se transfigura
Numa doçura
Muito mais pura
E muito mais nova …
Miguel Torga
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Avaliar...
Ter
a minha opinião
entre a excelência
e a perfeição
posso sempre melhorar.
Maria José Meireles
a minha opinião
entre a excelência
e a perfeição
posso sempre melhorar.
Maria José Meireles
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
Estágio...
Sou estagiária da vida.
Digo: bom dia, boa tarde, boa noite,
peço desculpa, agradeço...
Não importa
se visto calças ou saia
se estou rota ou não
se estou limpa ou suja
se tenho sapatos ou não,
uso o sorriso mais bonito
do meu mundo
e sou linda.
Maria José Meireles
Digo: bom dia, boa tarde, boa noite,
peço desculpa, agradeço...
Não importa
se visto calças ou saia
se estou rota ou não
se estou limpa ou suja
se tenho sapatos ou não,
uso o sorriso mais bonito
do meu mundo
e sou linda.
Maria José Meireles
domingo, 6 de fevereiro de 2011
sábado, 5 de fevereiro de 2011
Pensamento do dia...
O trabalho, não acaba. O dinheiro, já está feito.
Maria José Meireles
(sabedoria africana)
Maria José Meireles
(sabedoria africana)
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011
Cartas de amor
Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Álvaro de Campos
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Álvaro de Campos
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