segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Yanni - Nostalgia

Grande...

Morreste
absolutamente virgem
para que eu pudesse nascer
de mim.

Maria José Meireles

domingo, 26 de dezembro de 2010

Dedicatória...

Escreveste:
grande amiga da adolescência,
quando o tempo era eterno.
Pergunto:
deixamos de ser amigas
ou o nosso tempo continua eterno
e gratuito?

Maria José Meireles

Um violino na lama

Chove...

Mas isso que importa!
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir na chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?

Chove...

Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.

José Gomes Ferreira, in Antologia Poética, Porto Editora, 1974

O mistério das coisas erradas


(Obrigada Luz. Eu sei esperar...)

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010



(Obrigada Carlos. Fiquei feliz...)

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Azul e mar

O céu é azul,
O mar não ilude,
A terra não mente…
Por cada um destes olhares
Há sempre uma verdade
Que nos ensina a saber
Amar as coisas…
A presença sofismada
De pensar que só,
Por estar só, se está bem;
Apenas flutua
Em órbita da negação.

Augusto Canetas
Flashes

Natal...

Eu estava bonita
ele parecia atrasado
mental
(e não era pela roupa
era mesmo pela cara)
abordou-me
disse para eu não ter medo.
A vida ensinou-me
que os mais traiçoeiros
são os obedientes
(sempre bem parecidos).
Perguntei-lhe:
Porque haveria de ter medo?
Ele pediu desculpa
eu desejei-lhe Bom Natal.

Maria José Meireles


(Obrigada Fátima. Fiquei comovida...)

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

DEWEY



(Obrigada Lia. Fiquei comovida...)

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Fernão Capelo Gaivota



(Especialmente para o Bruno)

sábado, 18 de dezembro de 2010

TABACARIA

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
à parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei-de pensar?

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Génio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho genios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicómios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistámos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordámos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, para o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei que moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?),
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheco-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.

Álvaro de Campos

LIBERDADE

Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...

Fernando Pessoa

Pensamento do dia...

"Olhe, minha querida, se meus poemas são difíceis, a culpa não é minha. Juro que não tenho culpa. Meus poemas sofrem de mim."

Manoel de Barros

MOMENTOS

Pôr o Medo a Fugir



(Obrigada João. Valeste-me...)

O JARDINEIRO

A MORTE

E o Poeta morreu.
A sombra do cipreste pôde enfim
Abraçar o cipreste.
O torrão
Caiu desfeito ao chão
Da aventura celeste.

Nenhum tormento mais, nenhuma imagem
(No caixão, ninguém pode
Fantasiar).
Pronto para a viagem
De acabar.

Só no ouvido dos versos,
Onde a seiva não corre,
Uma rima perdura
A dizer com brandura
Que um Poeta não morre.

Miguel Torga
In Nihil Sibi, 1948

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Pensamento do dia...

O dinheiro pode não trazer felicidade mas põe um gajo bem disposto!

Franklin Cerqueira

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Kamelot - The Haunting

Improviso para metáfora convencional...

O universo
tem muita gente
que anda à procura
de uma casa
em que caiba
e nunca encontra
pelo menos
no tempo de uma vida
os gatos
ao invés
têm muitas vidas
e nunca desistem
pelo menos
antes da última.

Ademar

domingo, 12 de dezembro de 2010

Lou Reed live Walk and the wild side



(Especialmente para ...)

voce nao entende nada (Caetano Veloso)



(Especialmente para a Carmo e para mim)

Piscina novamente...

Carrega as pernas
porque tem esperança
nelas
de resto
nada
perfeitamente bem.

Maria José Meireles

Pensamento do dia...

Todos os meus pássaros são encantados.

Maria José Meireles

sábado, 11 de dezembro de 2010



(Obrigada Avelino. Fiquei comovida...)

Beautiful Day - U2



(Especialmente para os... "Estados Unidos" :) )

U2 - with or without out you lyrics


(Especialmente para a Dirinha)

Your Song - Theme from Moulin Rouge



(Especialmente para mim)

Fim do caminho...



Uns nascem
para morrer
outros morrem
para nascer.
Não te chorarei
para que nunca morras.

Maria José Meireles

Dissertação sobre o tempo…


Salvador Dali

Chego sempre atrasado
quando me chamas
as horas nunca esperam por mim
e é por isso que os relógios me odeiam
talvez seja o tempo a querer adiar
o futuro que tu desejas

Alexandre de Castro
retirado do Alpendre da Lua

MISS YOU



A saudade é a nossa alma dizendo para onde ela quer voltar.

Rubem Alves

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Ali Farka - Soumbou Ya Ya

Outra piscina...



Hoje
foi pequena.
Tinha lágrimas
dos quatro cantos
da Terra.
Ainda assim
estava doce.

Maria José Meireles

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Sete...

Criação do mundo
virtudes humanas
mares navegáveis
artes
notas musicais
cores do arco-íris
dias da semana.

Maria José Meireles
(Com a ajuda da Raquel)

Doze...

Meses do ano
discípulos de Jesus
frutos do Espírito Santo
tribos de Israel
filhos de Jacob
pedras preciosas
(da Coroa da Inglaterra)
portas da cidade de Jerusalém
(anjos que as custodiavam)
justo equilíbrio,
prudência
e forma graciosa.

Maria José Meireles

Dez...

Fiz-te com:
sabedoria
entendimento
conhecimento
bondade
severidade
harmonia
perseverança
esplendor
apego
e realeza
és completo
significas perfeição.

Maria José Meireles

Dezoito...

Encontrei-me
aleatoriamente
sou um número
natural
nasci
da soma dos números
da palavra
a unidade
foi-me prometida
pela soma
dos meus algarismos.

Maria José Meireles

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Abril de Abril

Era um Abril de amigo Abril de trigo
Abril de trevo e trégua e vinho e húmus
Abril de novos ritmos novos rumos.

Era um Abril comigo Abril contigo
ainda só ardor e sem ardil
Abril sem adjectivo Abril de Abril.

Era um Abril na praça Abril de massas
era um Abril na rua Abril a rodos
Abril de sol que nasce para todos.

Abril de vinho e sonho em nossas taças
era um Abril de clava Abril de acto
em mil novecentos e setenta e quatro.

Era um Abril viril Abril tão bravo
Abril de boca a abrir-se Abril palavra
esse Abril em que Abril se libertava.

Era um Abril de clava Abril de cravo
Abril de mão na mão e sem fantasmas
esse Abril em que Abril floriu nas armas.

MANUEL ALEGRE

Poesia vol I - Dom Quixote

Leonard Cohen - Hallelujah

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A palavra poema...

Muitas doenças que as pessoas têm são poemas presos.
Abcessos tumores nódulos.
Pedras são palavras calcificadas.
Poemas sem vazão.
Mesmo cravos, espinhas, cabelo encravado,
prisão de ventre, poderiam, um dia, ter sido poema.
Pessoas às vezes adoecem por manter a palavra presa.
Palavra boa é palavra líquida.
Escorrendo em estado de lágrima.
Lágrima é dor derretida .
Dor endurecida é tumor.
Lágrima é alegria derretida.
Alegria endurecida é tumor.
Lágrima é raiva derretida.
Raiva endurecida é tumor.
Lágrima é pessoa derretida
Pessoa endurecida é tumor.
Tempo endurecido é tumor
Tempo derretido é poema.
Palavra suor é melhor do que palavra cravo
que é melhor do que palavra ferida,
Que é melhor do que palavra nódulo,
Que nem chega perto da palavra tumores internos
Palavra lágrima é melhor
Palavra melhor ainda é poema!

Viviane Mosé

(Obrigada Rubem. Fiquei rendida...)

poema preso

domingo, 5 de dezembro de 2010

A menina e o pássaro encantado

jogo de ideias rubem alves parte2

Rubem Alves - Jogo de Idéias - Parte 1

Dissertação sobre o meu nascimento…



Quando eu nasci
no mês de Maio
a vinte e cinco
do ano de quarenta e quatro
minha mãe disse
que o sol dera duas voltas
e a lua andava aluada
tal como a cadela
que passou o dia a ganir
nessa noite os astros fizeram greve
e até uma senhora
vestida de branco aterrou
numa figueira, lá no quintal,
julgando ser uma azinheira
alguém a viu estatelada no chão
a praguejar contra a triste sorte
e a rezar orações estranhas
então a parteira, depois do susto,
virou-me de cabeça para baixo
para eu começar a chorar
e foi nesse momento que falei,
pela primeira e única vez,
a dizer que não queria ser santo,
guerreiro, nem banqueiro,
para não conspurcar o mundo
minha mãe julgou que eu
não iria sobreviver…

Alexandre de Castro

Lisboa, Maio de 2010

retirado do Alpendre da Lua

DJ BoBo - EVERYBODY - 1994

sábado, 4 de dezembro de 2010

Outra homenagem...

Escrevo
para não ser
mais um número
nas estatísticas
dos que se atiraram
atiram
ou atirarão
da ponte 25 de Abril.

Maria José Meireles

Pensamento do dia...

Há homens que lutam um dia, e são bons;
Há outros que lutam um ano, e são melhores;
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém há os que lutam toda a vida.
Estes são os imprescindíveis.

Bertold Brecht

Prospecção

Não são pepitas de oiro que procuro.
Oiro dentro de mim, terra singela!
Busco apenas aquela
Universal riqueza
Do homem que revolve a solidão:
O tesoiro sagrado
De nenhuma certeza,
Soterrado
Por mil certezas de aluvião.
Cavo,
Lavo,
Peneiro,
Mas só quero a fortuna
De me encontrar.
Poeta antes dos versos
E sede antes da fonte.
Puro como um deserto.
Inteiramente nu e descoberto.

Miguel Torga

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

The Beatles - Yesterday

Pensamento do dia...

Uma pessoa muda quando tem amor dentro de si.
Então, dá mais do que aparenta ter...

Margarida Cândida Jorge.
28 de Novembro de 2010.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Pensamento do dia...

A brincadeira torna feliz qualquer pessoa em qualquer idade.

Maria José Meireles
Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.

E então serás eterno.

Cecília Meireles

Partly Cloudy

Vida de inseto

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Dissertação sobre o entardecer…


Donzelas à beira mar -Dacha

À Dacha,
pelo seu amor à pintura

Todas as linhas
procuram o ponto de fuga
ou será que o horizonte
se diluiu no pôr-do-sol
quando pintavas o mar?
Não sei se as tuas mãos tremeram
e o teu corpo estremeceu de prazer
quando a luz
varreu a tela
e afogou o meu olhar.
E é naquele rio de águas brandas
e naquele mar de prata e de absinto
que eu gostava de me banhar
e responder ao apelo daqueles caminhos
que as tintas avermelharam
ao entardecer…

Alexandre de Castro

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A Dacha (Dália Faceira) é uma notável pintora, com uma obra assinalável no seu vasto currículo, e que eu já tive a oportunidade de abordar criticamente no Jornal do Douro, quando de uma exposição dos Antigos Alunos do Liceu de Lamego. Pediu-me para escrever um poema para o incluir no livro com as suas pinturas, a publicar brevemente. É uma honra poder dedicar-lho.

retirado do Alpendre da Lua

domingo, 28 de novembro de 2010

Filho...

Sobreviver-te
é muito duro
com a vantagem
de que a morte
fica assim
muito mais fácil.

Maria José Meireles

Homenagem...










Seguiste o teu funeral
carregando a tua mortalha
no dia do Juízo Final
tardiamente percebeste
que serviste a todos
menos a ti
e que não te era dada
uma segunda oportunidade
dizem que,
pouco antes de morreres
com cancro nos pulmões,
já não dizias
coisa com coisa.
Foi bom conhecer-te.

Maria José Meireles

Casablanca - As Time Goes By

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Um Poema para Galileu

Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele teu retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.
Disse Galeria dos Ofícios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.

Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria…
Eu sei… eu sei…
As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!

Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.

Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar- que disparate, Galileo!
- e jurava a pés juntos e apostava a cabeça
sem a menor hesitação-
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados são.

Pois não é evidente, Galileo?
Quem acredita que um penedo caia
com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?
Esta era a inteligência que Deus nos deu.

Estava agora a lembrar-me, Galileo,
daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo
e tinhas à tua frente
um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo
a olharem-te severamente.
Estavam todos a ralhar contigo,
que parecia impossível que um homem da tua idade
e da tua condição,
se tivesse tornado num perigo
para a Humanidade
e para a Civilização.
Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,
e percorrias, cheio de piedade,
os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.

Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,
desceram lá das suas alturas
e poisaram, como aves aturdidas - parece-me que estou a vê-las,
nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas.
E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual
conforme suas eminências desejavam,
e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal
e que os astros bailavam e entoavam
à meia-noite louvores à harmonia universal.
E juraste que nunca mais repetirias
nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,
aquelas abomináveis heresias
que ensinavas e descrevias
para eterna perdição da tua alma.
Ai Galileo!
Mal sabem os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo
que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,
andavam a correr e a rolar pelos espaços
à razão de trinta quilómetros por segundo.
Tu é que sabias, Galileo Galilei.

Por isso eram teus olhos misericordiosos,
por isso era teu coração cheio de piedade,
piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos
a quem Deus dispensou de buscar a verdade.
Por isso estoicamente, mansamente,
resististe a todas as torturas,
a todas as angústias, a todos os contratempos,
enquanto eles, do alto incessível das suas alturas,
foram caindo,
caindo,
caindo,
caindo,
caindo sempre,
e sempre,
ininterruptamente,
na razão directa do quadrado dos tempos.

António Gedeão

Aos Poetas

Somos nós
As humanas cigarras!
Nós,
Desde os tempos de Esopo conhecidos.
Nós,
Preguiçosos insectos perseguidos.
Somos nós os ridículos comparsas
Da fábula burguesa da formiga.
Nós, a tribo faminta de ciganos
Que se abriga
Ao luar.
Nós, que nunca passamos
A passar!...

Somos nós, e só nós podemos ter
Asas sonoras,
Asas que em certas horas
Palpitam,
Asas que morrem, mas que ressuscitam
Da sepultura!
E que da planura
Da seara
Erguem a um campo de maior altura
A mão que só altura semeara.

Por isso a vós, Poetas, eu levanto
A taça fraternal deste meu canto,
E bebo em vossa honra o doce vinho
Da amizade e da paz!
Vinho que não é meu,
mas sim do mosto que a beleza traz!

E vos digo e conjuro que canteis!
Que sejais menestreis
De uma gesta de amor universal!
Duma epopeia que não tenha reis,
Mas homens de tamanho natural!
Homens de toda a terra sem fronteiras!
De todos os feitios e maneiras,
Da cor que o sol lhes deu à flor da pele!
Crias de Adão e Eva verdadeiras!
Homens da torre de Babel!

Homens do dia a dia
Que levantem paredes de ilusão!
Homens de pés no chão,
Que se calcem de sonho e de poesia
Pela graça infantil da vossa mão!

Miguel Torga

The Neverending Story

Mantra Adi Divya com Carlos Cardoso

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Chico Gabriel - Institucional Creche da Vila XV

Pensamento do dia...

Poesia não é para descrever é para descobrir.

Manoel de Barros
A hora da partida soa quando
Escurece o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.

A hora da partida soa quando
as árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

Sophia de Mello Breyner Andresen

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo

Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa

Sophia de Mello Breyner Andresen

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Coisas pequenas (Madredeus)

Estado de coma...

Se tivesse uma horta
não precisava
de estar ligado à máquina.

Maria José Meireles

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Pensamento do dia...

A bondade é a única regra que se deve cumprir com zelo.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Contra a corrente...

Já não brinco
com o acaso.

Maria José Meireles

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Mais um dia sem o teu inebriante perfume,
passado ao sabor do relento,
olhando o céu de cor viva,
perguntando pelos teus passos ao vento.

Sofro aqui fazendo tempo,
procurando-te e encontrando-te a cada segundo,
no topo do meu coração,
bem no topo deste delicioso mundo.

Sem ti, ele não brilharia,
sem ti, ele cairia aos pedaços,
sem ti, ele não radiava energia sem fim,
enches o mundo de fraternos abraços.

Dás-lhe um encantamento especial,
num transe apaixonante recheado de chocolate,
recheado do doce sabor do teu mundo,
enfeitas o nosso mundo de ouro de alto quilate.

Trazes nas tuas palavras a paz,
trazes a alegria,
trazes a paixão,
enches o mundo com a tua harmonia.

Ler mais: http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=57294#ixzz15elZoMwW

Encontros Fortuitos...

Há vida na Terra!

Maria José Meireles

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Caetano Veloso - Os Argonautas

OMEGA electronic

No tempo dos relógios de sol
sempre havia de vez em quando
manhãs de nevoeiro!

Jorge de Sousa Braga,
O Poeta Nu [poesia reunida]
ASSÍRIO & ALVIM, JUNHO 2007

POEMA DE AMOR

Esta noite sonhei oferecer-te o anel de Saturno
e quase ia morrendo com o receio de que não
te coubesse no dedo

Jorge de Sousa Braga,
O Poeta Nu [poesia reunida]
ASSÍRIO & ALVIM, JUNHO 2007

SOBRE A VíRGULA

Vírgula pode ser uma pausa... ou não.
Não, espere.
Não espere...

Ela pode sumir com seu dinheiro.
23,4.
2,34.

Pode criar heróis...
Isso só, ele resolve.
Isso só ele resolve.

Ela pode ser a solução.
Vamos perder, nada foi resolvido.
Vamos perder nada, foi resolvido.

A vírgula muda uma opinião.
Não queremos saber.
Não, queremos saber.

A vírgula pode condenar ou salvar.
Não tenha clemência!
Não, tenha clemência!

Uma vírgula muda tudo.

José Carlos Gueta

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Sempre...

Ela
sempre foi ninguém
ele
sempre foi ninguém
um livro
sempre foi nada
ninguém deu nada
a ninguém
sempre.

Maria José Meireles

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Improviso para perguntar afinal o teu nome...

Tanto ou tão breve destino
entre as minhas palavras
e o teu olhar tão fiel
é aqui
todas as noites
neste bar de desterrados
que nos cruzamos
e por nenhuma porta
entramos ou saímos
entre comungarmos
o arbítrio das sombras
numa tela com a forma
de uma cama
ou de uma mesa
sobre a qual sempre adormecêssemos
antes mesmo de nos cuidarmos
a poesia tem as fronteiras exactas
deste silêncio compartilhado
encontramo-nos aqui
como em tempo algum
e seremos sempre felizes
assim.

Ademar

O teu riso



Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

Pablo Neruda

O POETA NU [poesia reunida]



(Obrigada Graça. Fiquei contente...)
Vou ao céu
E venho-
-me

Jorge de Sousa Braga,
O Poeta Nu [poesia reunida]
ASSÍRIO & ALVIM, JUNHO 2007
Tu eras também uma pequena folha
que tremia no meu peito.
O vento da vida pôs-te ali.
A princípio não te vi: não soube
que ias comigo,
até que as tuas raízes
atravessaram o meu peito,
se uniram aos fios do meu sangue,
falaram pela minha boca,
floresceram comigo.

Pablo Neruda

domingo, 14 de novembro de 2010

Abertura, Glauber Rocha

Nessa casona, hoje, um homem espera a Morte.
Eu. Nem homem sou.
Sou é um des-homem,
de punhos atados,
de dentes cerrados,
de pernas peadas,
aos pés do Senhor!
Quanta coisa boa!
Mas devo respeitar o espaço, e só tenho tempo de falar de Emilinha,
uma gostosura de poema e de figura:
Emilinha não era desse mundo.
Ou era, demais da conta.
Safada de nascença.
Nela havia o sumo de dez,
de cem mulheres
muito fêmeas.
Tanto que extravasava,
sopitava em cheiros e barbas.
Suspiros e choros.
Era uma força viva,
selvagem como esses bichos silvestres.
Emilinha me fez homem
como jamais fui antes nem depois.
parecia até feitiço.
Eu e ela inesgotáveis...
Vi por fim,
me convenci,
de que Lea me vencia,
me amofinava.
Era mulher demais para um homem só.
Eu não podia com a mulinha!.

DARCY RIBEIRO

Muda de Vida/Humanos (letras)

sábado, 13 de novembro de 2010

Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu.

DARCY RIBEIRO

Comunicado

Na frente ocidental nada de novo.
O povo
Continua a resistir.
Sem ninguém que lhe valha,
Geme e trabalha
Até cair.

Miguel Torga

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ariane

Ariane é um navio.
Tem mastros, velas e bandeira à proa,
E chegou num dia branco, frio,
A este rio Tejo de Lisboa.

Carregado de Sonho, fundeou
Dentro da claridade destas grades...
Cisne de todos, que se foi, voltou
Só para os olhos de quem tem saudades...

Foram duas fragatas ver quem era
Um tal milagre assim: era um navio
Que se balança ali à minha espera
Entre as gaivotas que se dão no rio.

Mas eu é que não pude ainda por meus passos
Sair desta prisão em corpo inteiro,
E levantar âncora, e cair nos braços
De Ariane, o veleiro.

Miguel Torga

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Improviso para dizer apenas duas frases...

Perguntas-me se sou famoso
e eu respondo
só eu me conheço
nada do que digam
ou pensem de mim
acrescentará substância
ao que não cheguei a ser.

Ademar

BRINQUEDO

Foi um sonho que eu tive:
Era uma grande estrela de papel,
Um cordel
E um menino de bibe.

O menino tinha lançado a estrela
Com ar de quem semeia uma ilusão;
E a estrela ia subindo, azul e amarela,
Presa pelo cordel à sua mão.

Mas tão alto subiu
Que deixou de ser estrela de papel.
E o menino, ao vê-la assim, sorriu
E cortou-lhe o cordel.

Miguel Torga
Diário, vol.II, in Poesia Completa, Lisboa
2ª ed. Publicações D. Quixote, 2002
A minha música não é contra os brancos.
Eu nunca poderia cantar isso.
A minha música é contra o sistema, que ensina você a viver e a morrer.

Bob Marley

Bob marley "no woman no cry" 1979

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Serenidade...

Hoje
vou visitar-te
pousarei minha cabeça
no teu colo
vamos rir juntos
de toda a estupidez
e da vaidade
instaladas
alivio a minha solidão
e as minhas dores
de alma
depois regresso
sem ti
ao meu inferno.

Maria José Meireles

sábado, 6 de novembro de 2010

O autor, pelo próprio

(...)
"Depois de todas as divergências que falhou, sobra-lhe uma certeza introspectiva: morrerá de inibições."

Ademar
publicado em "Descansando do Futuro (Reserva de Intimidade)", Asa, 2003

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Pensamento do dia...

Uma boa esposa e boa mãe, merece um bom amante.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

MAR

Não te espantes com máquinas,
com invenções de última hora.
Inacreditável é a quantidade de elementos
que ainda não obedecem aos homens.

Gonçalo M. Tavares

Rita Redshoes - Choose Love

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa

Narciso e Goldmund

terça-feira, 2 de novembro de 2010

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A um poeta

Tu, que dormes, espírito sereno,
Posto à sombra dos cedros seculares,
Como um levita à sombra dos altares,
Longe da luta e do fragor terreno,

Acorda! é tempo! O sol, já alto e pleno,
Afuguentou as larvas tumulares...
Para surgir do seio desses mares,
Um mundo novo espera só um aceno...

Escuta! é a grande voz das multidões!
São teus irmãos, que se erguem! são canções...
Mas de guerra... e são vozes de rebate!

Ergue-te pois, soldado do Futuro,
E dos raios de luz do sonho puro,
Sonhador, faze espada de combate!

Antero de Quental

domingo, 31 de outubro de 2010

Pensamento do dia...

Quero uma vida efémera e uma morte eterna.

sábado, 30 de outubro de 2010

Minas Gerais - Milton Nascimento

Pensamento do dia...

"Aquilo que não me destrói fortalece-me"

Friedrich Nietzsche

Improviso policial...

Quis cometer um crime perfeito
mas tu não deixaste
protegeste-te com uma partitura
e aparaste o golpe
muitas palavras depois
invocaste a inteligência
que nunca desarma
e ousaste a nudez
de um ego fortalecido
sim
eu não chegara a feri-lo
acariciara-o apenas.

Ademar

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Improviso para reiniciar a história...

Amor é negócio de almas
poupai-o à circunstância dos corpos.

Ademar

milagre dos peixes

Bebe e cachorro. Lindo!

Pensamento do dia...

Eles e elas desertam sempre um dia antes do fim do prazo.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Improviso para Franciscar...

Já não sei contar estórias
nem histórias
mas o Francisco pergunta
por que escrevo estória
em vez de história
e história
em vez de estória
e eu conto
o amor não se vende
nem se aluga
oferece-se apenas
não tem mercado.

Ademar

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Paraíso...

Posso portar-me bem
posso portar-me mal
sei que me esperas
nem tenho de ligar
uma hora antes
vais abrir-me a porta
e mais
não digo.

Maria José Meireles

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

domingo, 24 de outubro de 2010

Prosperidade...

Fecho os olhos
sonho-me
ao longe a crise
em mim
a ausência
o tango
e um sorriso.

Maria José Meireles

Improviso mínimo...

Deixa-me existir offline
não me peças uma vida
para pendurar
todos os dias
à janela.

Ademar

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Optimismo e Esperança na Educação



(Obrigada Miguel. Fiquei contente...)

A Nossa Vida Emocional



(Obrigada Miguel. Fiquei contente...)

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Como a doce maçã que rubra, muito rubra,
lá em cima, no alto do mais alto ramo
os colhedores esqueceram; não,
não esqueceram, não puderam atingir.

Safo

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Para tão longo amor tão curta a vida

Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
Mas não servia ao pai, servia a ela,
E a ela só por prémio pretendia.

Os dias, na esperança de um só dia,
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe dava Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos
Lhe fora assim negada a sua pastora,
Como se a não tivera merecida;

Começa de servir outros sete anos,
Dizendo: – Mais servira, se não fora
Para tão longo amor tão curta a vida!

Luís Vaz de Camões (1524-1580)

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Improviso para roque...

Fazes-me todos os dias
a mesma pergunta
e todos os dias eu te respondo
da mesma maneira
o xadrez que jogamos
tem apenas duas peças
e nenhuma vencerá
por ausência de todas as outras.

Ademar

domingo, 17 de outubro de 2010

Comunhão...



Isso mesmo
hoje
não estou de dieta
e é o dia
de todos os santos.
Como-te,
bebo-te,
celebro-te
e brindo
à minha,
à tua
e à nossa saúde.

Maria José Meireles

sábado, 16 de outubro de 2010

Como amar uma criança

Pensamento do dia...

"... O estudo da gramática não faz poetas. O estudo da harmonia não faz compositores. O estudo da psicologia não faz pessoas equilibradas. O estudo das "ciências da educação" não faz educadores. Educadores não podem ser produzidos. Educadores nascem. O que se pode fazer é ajudá-los a nascer. Para isso eu falo e escrevo: para que eles tenham coragem de nascer..."

Rubem Alves

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

PARABÉNS PROFESSOR! 15 de outubro de 2010

Violência Doméstica...

Precisa
do Sábado
para descansar.
No Domingo não pode
(tem de ir à missa).
Nem a pedido
dos filhos
se protegeu
do pai deles.
Salvaram-na
os irmãos
de sangue.

Maria José Meireles

Memória do que serei...

Morreste
sem que chegasse
a conhecer-te.
Quanto a mim
espero
que não aconteça
o mesmo.

Maria José Meireles

Pensamento do dia...

O mundo, que não é causador de nenhum bem, é cúmplice de muitas infelicidades; depois, quando vê eclodir o mal que ele maternalmente chocou, renega-o e vinga-se.

Honoré de Balzac

Comer, Rezar, Amar

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Mil Anos...

Calcei três filhos
mas não pude calçar-me
e os meus pés
já não crescem.
Quando os pés
dos meus filhos
deixarem de crescer
ganharei
sapatos novos.
Hei-de viver
mil anos
para que se cumpra
o que está escrito.

Maria José Meireles

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O nada que é tudo

Os nadas da vida
transformam-nos em silêncios
contidos ou magoados...
deixam de ser nada
para serem TUDO.

Francisco Rodrigues

Pensamento do dia...

"Somente onde há sepulturas há também ressurreições"

Nietzsche

Duo MainTenanT - Benissimo

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Fractalmente...


(Fractais de Joe Clark)

Fractalmente
reúno-me a ti
no céu e no mar
(e nas marés)
e talvez na praia
e no vento
um infinitésimo
tão infinito
ou o infinitamente
perfeito
abraço a loucura
nessa equação
como se
matematicamente
ainda delirasse.

Maria José Meireles

Famílias...

O Pai
partiu um pé
a Mãe
espreitou a morte
a tia
teve um AVC
o cão
está preso
...
e o filho?

Maria José Meireles

domingo, 10 de outubro de 2010

Improviso para cena breve, muito breve...

Perguntas
o que me podes dar
respondo-te assim
tenho tudo
menos tempo para esperar.

Ademar

O sabor dos netos...

Hoje
a avó
guarda figos
para o neto
que ontem
disse
a quem lhos oferecia:
nunca provei
mas sei que não gosto.

Maria José Meireles

Nota, quase, de rodapé...

Para além
da pessoa
que te oferecia rosas
existes tu
que cuidaste
dos filhos
da pessoa
que te oferecia rosas.

Maria José Meireles

sábado, 9 de outubro de 2010

God - John Lennon

Primeiro emprego...

Perguntas
qual é o meu emprego
e eu respondo
sou biscateiro.

Maria José Meireles

Conjugalidades...

O Pai
e a Mãe
arrumam a casa
deitam os filhos
e
por fim
ficam sós.

Maria José Meireles

Improviso entre amanheceres...

O universo virado do avesso
nos pés que desaprenderam
de caminhar sobre o fogo
as palavras suspensas
sobre a terra que arde
enquanto a matéria levita
este tango tem a forma
de uma girafa voadora
e há conchas que bebem
suores adormecidos
o mar que funde no teu corpo
e as mãos que te recolhem
e guardam.

Ademar

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Improviso místico...

Dessa janela de que me falas
vês o mar
e as algemas
e há vozes de crianças
que dançam a rotina das ondas
ignorando a tua condição de barco
ou de bóia
e todos os tédios servidos à mesa
de Tântalo
nas noites desabrigadas de luar
dessa janela de que me falas
vês o mar ou o que imaginas dele
e talvez na linha do horizonte
eu seja ainda o sol
que se ajoelha ao fim da tarde
para rezar a todos os deuses impossíveis.

Ademar

Incandescências...

Água afoga
água apaga o fogo.
Na frente
está a piscina
nas mãos
em brasa
os restos mortais
da mãe
que caiu na lareira acesa
quando tinhas
apenas três anos.
Solta as brasas
eu seguro-te.

Maria José Meireles

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Rastos...

Tudo fica
para trás
tudo
menos a literatura.
Agora sei
há olhos que ajoelham.

Maria José Meireles

Improviso para urgência...

Este veneno
infecta a alma
não há sangue
que o conduza
entre os vários sentidos
é quase uma pré-existência
um projecto de destinos interrogados
e sempre inviáveis
este veneno pede a picada da eternidade
nos teus lábios ausentes
uma implosão de metáforas
entre rios de lavas
que nenhuma margem contém
este veneno
tem o princípio activo de um poema
escrito a fogo na porta sempre fechada
da tua loucura.

Ademar
No mistério do sem-fim
equilibra-se um planeta.
E no planeta um jardim
e no jardim um canteiro
no canteiro uma violeta
e sobre ela o dia inteiro
entre o planeta e o sem-fim
a asa de uma borboleta.

Cecília Meireles

Escola da Ponte

Adolescências...

Sim,
falámos
da poluição do medo,
da falta de pai e de mãe,
e de rezar
sem justa causa.
Fomos adolescentes
e despedimo-nos
antes do pôr do sol.

Maria José Meireles

Improviso ainda para segredar...

Vens e vais
e nunca ficas
este é o único lugar no universo
que te pertence por inteiro
exactamente
porque não lhe pertences
e nada aqui te pertence
senão o tempo
essa urgência de fogo
em que ardemos
antes de todas as noites
que nunca serão
o nosso amor
deixa-me dizer assim para que todos entendam
é um segredo.

Ademar

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Pensamento do dia...

"Pensei, então, que o ato de plantar uma árvore é um anúncio de esperança. Especialmente se for uma árvore de crescimento lento. E isso porque, sendo lento o seu crescimento, eu a plantarei sabendo que nem vou comer dos seus frutos e nem vou me assentar à sua sombra.... Eu a plantarei pensando naqueles que comerão dos seus frutos e se assentarão à sua sombra. E isso bastará para me trazer felicidade!"

Rubem Alves

Apeadeiro...

Na terra do que fui
a linha do comboio é um beco
termo
para quem chega
princípio
para quem parte.

Maria José Meireles

Amarações...

Divido o espaço
em três partes
um relógio de campo
um beijo de mar
e uma caixa de música.
A infância
regressa-me ao campo
e o amor amara-me
a uma espécie de silêncio.
Na cidade
baralho-me
e escolho uma parte
à sorte
de cada vez.

Maria José Meireles

Toda a vida...

Pergunto
se a saudade
mata.
Respondes:
Florentino Ariza
esperou
cinquenta e três anos,
sete meses,
onze dias
(com todas as suas noites)
e não morreu.

Maria José Meireles

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Infâncias...


Picasso

Subimos juntos
a Tarimba.
O acaso quis
que o meu irmão levasse
fêmea
e eu
macho.
Trocámos.
Aos gatos não fez diferença.
Ao acaso
também não.

Maria José Meireles

Moda...

Em silêncio
percebia assustada
que as suas respostas
eram tão diferentes
das respostas dos outros.
Sossegou
ao receber o teste
e perceber
que tinha tudo certo.

Maria José Meireles

domingo, 3 de outubro de 2010

Improviso para lembrar que o inverno desfalece...

Uma sopa
a sobremesa
ou a mesa posta sobre a metáfora
a servir de altar
a toalha de rendas
que a mãe teceu
e o pai sempre ausente
traído no desconhecimento
da perícia das mãos
essa mulher que nunca deixou de arder
no silêncio
e que põe rosas
no lugar da alma
como se já cheirasse a primavera.

Ademar

Moça Com Brinco de Pérola

sábado, 2 de outubro de 2010

Aura...

Disse:
se as mulheres
se unem
os homens ficam
a água e pão.
Elogiou a minha aura
e eu elogio-lhe o olhar.

Maria José Meireles

Testemunho...

Não respeitou
o peão
mas respeitou
a passadeira.

Maria José Meireles

Escrevo Dentro da Noite

Mãe - Eugénio de Andrade

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Pensamento do dia...

...
Então compreendi que a verdadeira amizade é aquela que é livre para perceber que o outro é diferente daquilo que pensávamos; e é livre para perceber os ciclos da vida; e é tão livre para receber os pequenos tesouros que um amigo pode trazer como para largar e deixar ir. Talvez volte a encontrar a Mariana*, talvez não. Se sim, terei um gosto imenso em conhecê-la de novo. Se não, confio que a vida a levará na palma das mãos rumo ao crescimento e à liberdade.

João Delicado

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Em minha casa...

Quando as mãos
já alimentaram
todas as fomes
e os pássaros
já beberam
na fonte
recebo-te
em minha casa
neste bar de desterrados
e somos felizes
assim.

Maria José Meireles

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Improviso sobre a tristeza...

Há dias em que me entristeço
deixo-me conduzir por Piazzolla
e danço longamente comigo
um tango que parece apenas querer chorar
não tenho companhia para o espelho
não tenho companhia para a lágrima
e o violino sai para a rua sozinho
e eu saio com ele
atrás de uma memória de festas
que ainda não escrevi.

Ademar

terça-feira, 28 de setembro de 2010

sábado, 25 de setembro de 2010

Números redondos...

Ela
fez 50 anos
encontrou 50 amigos
e
ofereceu 50 rosas.

Maria José Meireles

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Salmão do Pacífico...

Raros são
os que morrem
exactamente
onde nasceram
morreste
para nascer em mim
como um filho
que nasce
ao contrário
e o cheiro da morte
espalha-se
como um sinal
de vida.

Maria José Meireles

Dissertação sobre um relógio sem ponteiros…


Salvador Dali

Passo os dias a contar
as horas e os minutos
num relógio invisível
na parede onde ainda
está o teu retrato.
Tu levaste os ponteiros
e nunca mais voltaste
só porque queres
contar o tempo
à tua maneira.

Alexandre de Castro
retirado do Alpendre da Lua

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Idade da inocência...

Falava
até sem pensar
não podia imaginar
que alguém
pudesse ouvir
e ser servida
não lhe cabia.

Maria José Meireles

Pensamento do dia...

A liberdade cabe entre o controlo e o abandono.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Reencontro...

Tenho
para ti
um tempo eterno
e gratuito
volta
somente quando
não tiveres dúvidas.

Maria José Meireles

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Segredo...

Há quem esconda
a beleza
há quem esconda
a feiúra
e há quem
simplesmente
se deixe existir.

Maria José Meireles

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

sábado, 11 de setembro de 2010

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Sesc Carmo

Verdade...

Ela
sabia que era
muito pequena
que ninguém acreditaria
por isso calou
cresceu
falou
e ninguém duvidou
da sua palavra.

Maria José Meireles

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Tranca...

Ela sentiu-se
desarmada
como um homem
que depois de assaltado
retirasse a tranca
da porta.

Maria José Meireles

domingo, 5 de setembro de 2010

The Police - Roxanne

Abrigo...

Os pássaros
chegam
vendados
amordaçados
ou com antolhos
feridos
sedentos
ou esfaimados
e dizem:
é bom este abrigo
é bom este vazio.

Maria José Meireles

sábado, 4 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Escapar...

Mando
somente
em mim
ainda assim
por vezes
escapo-me.

Maria José Meireles

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Improviso ferroviário...

Da varanda do quarto da minha infância
todos os comboios chegavam
todos os comboios partiam
e só eu ficava
a minha infância era uma cidade
que os comboios não atravessavam
nessa idade
eu tinha mapas nos olhos
que soletravam viagens
e ainda não sabia
que todos os cais terminavam
nos braços infinitos da água.

Ademar

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Improviso para cota e violoncelo...

Guarda-me por uma vez na estante
dos teus segredos
que eu seja somente
uma dedicatória
ou nem isso
um livro mais
entre tantos
oferecido
ao tempo furioso das tuas mãos
e tão breve
e lê-me apenas
quando tiveres saudades
dos olhos com que me adormeces
encaderna-me se quiseres
para que eu dure ainda mais
e abre-me devagar
folheia-me lentamente
página a página
na íntima desordem
dos teus pensamentos.

Ademar

Girafas...

Hei-de acreditar
que as girafas
já não cantam?
Conheço o seu brado
e é-me impossível
não acreditar
nos meus próprios ouvidos.

Maria José Meireles

Beethoven Symphony No.9

Nosso corpo é feito com aquilo que o amor pôs lá dentro.
E onde o amor quis, mas não pôde, ficou um vazio, que é onde mora a saudade.

Rubem Alves

domingo, 29 de agosto de 2010

Porta...

Toda a viagem termina
onde a saudade acontece
é certo que virão
e com o teu nome
se há-de abrir
a porta
que os espera.

Maria José Meireles

sábado, 28 de agosto de 2010

Bondade...

Não me toques
não agora
não tu
estou frágil
como uma bola de sabão
e a tua bondade
pode ser fatal.

Maria José Meireles

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Improviso a benefício da saudade…

Um dia
quando eu já for uma ausência eterna
ler-me-ás talvez com outros olhos
a morte que sempre há-de iluminar-nos.

Ademar
Será possível, então, um triunfo no amor?
Sim.
Mas ele não se encontra no final do caminho: não na partida, não na chegada, mas na travessia.

Rubem Alves
Não me falou em amor. Essa palavra de luxo.

Adélia Prado

Zubin Mehta Conducts Israel Philharmonic with Viviane Hagner

LEÃOZINHO, Caetano Veloso

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

No Céu...

Diz
não sentir o corpo
e ser bom
por poder dizer:
Estou no Céu!

Maria José Meireles

Sentido...

Como não tenho
500 anos de esperança
reparto-me pelas aldeias
(as que conseguir tocar)
para perceber
o sentido
de toda a vida.

Maria José Meireles

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Ironia...

Com que prazer sádico
me recomendas um médico,
se não me recomendas
nem a Vida nem este Mundo?
Para me atirar da ponte
não é necessário fazer análises
e até a ironia tem limites.

Maria José Meireles

domingo, 8 de agosto de 2010

A Dança das Algas

Pedra marítima enrolada no marulhar das vagas
Retrocede às mais íntimas planuras
E queda-se baixinho murmurando:
Ó solidão das lisas madrugadas.

Dedilhaste com jeito clássico
As músicas aquáticas dos ventos
Quando surgiste, despontaram flores
E derramaram-se perfumes pelos ares.

Devagar desfolhaste os teus ensinamentos
à natureza grávida das árvores
Aos montes lúcidos da neve,
E aos píncaros altíssimos das águias.

Tudo ouviu a tua voz e ficou mudo
Porque nada sabia nomear-te
E sob as asas côncavas das aves
As pérolas da vida reluziam.

Algas dançavam pelo espaço pleno
Nos teus olhos pousavam mansamente
Como passos de reis em pétalas de espuma.
A terra fecundada deslizava nos laranjais juncados de ternura.

Só tu brincavas entre as dunas brancas
E dos teus dedos saíam melodias
Que os peixes boquiabertos recebiam
Nos vidros transparentes das escamas.

O sol almofadado, róseo,
cobria tardes sossegadas.
Voltavam vagamente os sons do mar
Roçando as folhas verdes que tremiam.

E do silêncio extático das horas
A tua mão secreta se estendia
Era a dança das algas da saudade
Tu dançavas com elas e morrias.

Mário Garcia,SJ

A Estória...


Salvador Dali

1. Sobre a mesa, um café
mais afecto, menos açúcar
2. o cheiro das camélias
o vinho inebriante
3. um tango em forma de girafa voadora
o mar numa concha de lábios
4. o anel
5. a fonte, o rio e o ribeiro
6. a ponte da felicidade, os brinquedos
o quarto do espelho
7. um excesso de luz
olhos que ajoelham
8. um livro com dedicatória
9. a porta fechada
por fora.

Maria José Meireles

Dissertação sobre a solidão…



O mais difícil de imaginar
é cortar as amarras do navio
quando o cais está vazio
sem lenços brancos na hora da despedida
já só tenho as carícias do vento
e o balanço incerto das ondas
contra o casco
até tu faltaste neste momento
quando enfrento a largura deste mar de desassossego
mas sei que alguém me espera num outro porto
para me salvar.

Alexandre de Castro
retirado do Alpendre da Lua

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Adélia Prado fala sobre amor

Improviso de género...

Talvez tenhas razão
talvez a loucura seja
como dizes
uma propriedade feminina
um excesso de luz
um encandeamento dos sentidos
deixas de ver
e enlouqueces
há mulheres
que se desintegram assim
numa espécie de névoa interior
como se
simplesmente
adormecessem por dentro.

Ademar

Improviso para Arianna...

O sangue no lugar da água
em todas as fontes
e no corpo que te pertence
a harpa
se a dor tocasse assim a beleza dos homens
todos os homens seriam eternos.

Ademar

Os poemas

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...

QUINTANA, Mário. Esconderijos do tempo. Porto Alegre: L&PM,1980.

Poemas de amor

"Compreendi que a vida não é uma sonata que, para realizar sua beleza, tem de ser tocada até o fim.
Dei-me conta, ao contrário, de que a vida é um album de minissonatas.
Cada momento de beleza vivido e amado, por efêmero que seja, é uma experiência completa que está destinada à eternidade.
Um único momento de beleza e de amor justifica a vida inteira"

Rubem Alves