Só lembra a idade
quando lha perguntam
queria fazer renda
na missa
para ouvir
não é necessário ver.
Maria José Meireles
sexta-feira, 30 de abril de 2010
A velha árvore...
Nunca
me sinto
tão acolhida
como quando
abraço
a velha árvore
em segredo
e em silêncio.
Maria José Meireles
me sinto
tão acolhida
como quando
abraço
a velha árvore
em segredo
e em silêncio.
Maria José Meireles
terça-feira, 27 de abril de 2010
Selva...
Quer
comprar Portugal
inteirinho
para construir
uma selva
onde
animais
em vias de extinção
possam sobreviver.
Quero
entender
o seu significado.
Maria José Meireles
comprar Portugal
inteirinho
para construir
uma selva
onde
animais
em vias de extinção
possam sobreviver.
Quero
entender
o seu significado.
Maria José Meireles
domingo, 25 de abril de 2010
Alice Machado
Eu não quero a minha casa transformada
Num jazigo onde a tristeza se instalou.
Quero as portas e as janelas escancaradas,
A dizer que a liberdade, enfim, chegou!
Olho o mundo e saboreio como a vida
É diferente, se vivida em liberdade,
Sem peias, sem pressões, não perseguida:
Fazer tudo a depender só da vontade!
E ao ver tantos derrotados, ao meu lado,
Que deixaram de ser escravos de mandões,
Eu quero deixar-te apenas um recado:
Sai-me de casa! Enche agora os teus
pulmões,
Deste ar puro, já que não estás obrigado
A voltar ao ar viciado dos glutões!
Alice Machado
Num jazigo onde a tristeza se instalou.
Quero as portas e as janelas escancaradas,
A dizer que a liberdade, enfim, chegou!
Olho o mundo e saboreio como a vida
É diferente, se vivida em liberdade,
Sem peias, sem pressões, não perseguida:
Fazer tudo a depender só da vontade!
E ao ver tantos derrotados, ao meu lado,
Que deixaram de ser escravos de mandões,
Eu quero deixar-te apenas um recado:
Sai-me de casa! Enche agora os teus
pulmões,
Deste ar puro, já que não estás obrigado
A voltar ao ar viciado dos glutões!
Alice Machado
sábado, 24 de abril de 2010
quinta-feira, 22 de abril de 2010
Proposta...
Faz propostas
indecentes
sem perder a paciência
não exijas
à vida
ela não se quer casada
muito menos com a culpa
e é mais difícil
vencer a morte
do que dizer
simplesmente
sim.
Maria José Meireles
indecentes
sem perder a paciência
não exijas
à vida
ela não se quer casada
muito menos com a culpa
e é mais difícil
vencer a morte
do que dizer
simplesmente
sim.
Maria José Meireles
terça-feira, 20 de abril de 2010
segunda-feira, 19 de abril de 2010
Sabedoria...
A gaiola
estava suja
(nem qualquer um
tem um mocho).
Prendeu o mocho
na corda
a corda
no pau
enquanto lavava a gaiola
o gato
comeu o mocho
e a gaiola
estava limpa.
Maria José Meireles
estava suja
(nem qualquer um
tem um mocho).
Prendeu o mocho
na corda
a corda
no pau
enquanto lavava a gaiola
o gato
comeu o mocho
e a gaiola
estava limpa.
Maria José Meireles
sábado, 17 de abril de 2010
sexta-feira, 16 de abril de 2010
Tempo...
Procuro-me
em todos os espelhos
o tempo
passa ao meu lado
serei talvez
uma boa semente.
Maria José Meireles
em todos os espelhos
o tempo
passa ao meu lado
serei talvez
uma boa semente.
Maria José Meireles
domingo, 11 de abril de 2010
quarta-feira, 7 de abril de 2010
Maria...
Regresso
cansado
triste
preso num espelho
qualquer.
Encontro-te
grávida de mim
e não posso
abandonar o nosso filho.
Maria José Meireles
cansado
triste
preso num espelho
qualquer.
Encontro-te
grávida de mim
e não posso
abandonar o nosso filho.
Maria José Meireles
segunda-feira, 5 de abril de 2010
Casamento...
Se me convidas
a uma longa viagem
digo-te:
contigo
vou onde quiseres.
Sempre que te viajo
tenho
a sensação
de nada me faltar.
Talvez me bastes.
Maria José Meireles
a uma longa viagem
digo-te:
contigo
vou onde quiseres.
Sempre que te viajo
tenho
a sensação
de nada me faltar.
Talvez me bastes.
Maria José Meireles
I - Vem, Noite antiquíssima e idêntica,
DOIS EXCERTOS DE ODES
(FINS DE DUAS ODES, NATURALMENTE)
I
......
Vem, Noite antiquíssima e idêntica,
Noite Rainha nascida destronada,
Noite igual por dentro ao silêncio. Noite
Com as estrelas lantejoulas rápidas
No teu vestido franjado de Infinito.
Vem, vagamente,
Vem, levemente,
Vem sozinha, solene, com as mãos caídas
Ao teu lado, vem
E traz os montes longínquos para o pé das árvores próximas.
Funde num campo teu todos os campos que vejo,
Faze da montanha um bloco só do teu corpo,
Apaga-lhe todas as diferenças que de longe vejo.
Todas as estradas que a sobem,
Todas as várias árvores que a fazem verde-escuro ao longe.
Todas as casas brancas e com fumo entre as árvores,
E deixa só uma luz e outra luz e mais outra,
Na distância imprecisa e vagamente perturbadora.
Na distância subitamente impossível de percorrer.
Nossa Senhora
Das coisas impossíveis que procuramos em vão,
Dos sonhos que vêm ter connosco ao crepúsculo, à janela.
Dos propósitos que nos acariciam
Nos grandes terraços dos hotéis cosmopolitas
Ao som europeu das músicas e das vozes longe e perto.
E que doem por sabermos que nunca os realizaremos...
Vem, e embala-nos,
Vem e afaga-nos.
Beija-nos silenciosamente na fronte,
Tão levemente na fronte que não saibamos que nos beijam
Senão por uma diferença na alma.
E um vago soluço partindo melodiosamente
Do antiquíssimo de nós
Onde têm raiz todas essas árvores de maravilha
Cujos frutos são os sonhos que afagamos e amamos
Porque os sabemos fora de relação com o que há na vida.
Vem soleníssima,
Soleníssima e cheia
De uma oculta vontade de soluçar,
Talvez porque a alma é grande e a vida pequena.
E todos os gestos não saem do nosso corpo
E só alcançamos onde o nosso braço chega,
E só vemos até onde chega o nosso olhar.
Vem, dolorosa,
Mater-Dolorosa das Angústias dos Tímidos,
Turris-Eburnea das Tristezas dos Desprezados,
Mão fresca sobre a testa em febre dos humildes.
Sabor de água sobre os lábios secos dos Cansados.
Vem, lá do fundo
Do horizonte lívido,
Vem e arranca-me
Do solo de angústia e de inutilidade
Onde vicejo.
Apanha-me do meu solo, malmequer esquecido,
Folha a folha lê em mim não sei que sina
E desfolha-me para teu agrado,
Para teu agrado silencioso e fresco.
Uma folha de mim lança para o Norte,
Onde estão as cidades de Hoje que eu tanto amei;
Outra folha de mim lança para o Sul,
Onde estão os mares que os Navegadores abriram;
Outra folha minha atira ao Ocidente,
Onde arde ao rubro tudo o que talvez seja o Futuro,
Que eu sem conhecer adoro;
E a outra, as outras, o resto de mim
Atira ao Oriente,
Ao Oriente donde vem tudo, o dia e a fé,
Ao Oriente pomposo e fanático e quente,
Ao Oriente excessivo que eu nunca verei,
Ao Oriente budista, bramânico, sintoísta,
Ao Oriente que tudo o que nós não temos.
Que tudo o que nós não somos,
Ao Oriente onde — quem sabe? — Cristo talvez ainda hoje viva,
Onde Deus talvez exista realmente e mandando tudo...
Vem sobre os mares,
Sobre os mares maiores,
Sobre os mares sem horizontes precisos,
Vem e passa a mão pelo dorso da fera,
E acalma-o misteriosamente,
Ó domadora hipnótica das coisas que se agitam muito!
Vem, cuidadosa,
Vem, maternal,
Pé antepé enfermeira antiquíssima, que te sentaste
À cabeceira dos deuses das fés já perdidas,
E que viste nascer Jeová e Júpiter,
E sorriste porque tudo te é falso e inútil.
Vem, Noite silenciosa e extática,
Vem envolver na noite manto branco
O meu coração...
Serenamente como uma brisa na tarde leve,
Tranquilamente com um gesto materno afagando.
Com as estrelas luzindo nas tuas mãos
E a lua máscara misteriosa sobre a tua face.
Todos os sons soam de outra maneira
Quando tu vens.
Quando tu entras baixam todas as vozes,
Ninguém te vê entrar.
Ninguém sabe quando entraste,
Senão de repente, vendo que tudo se recolhe,
Que tudo perde as arestas e as cores,
E que no alto céu ainda claramente azul
Já crescente nítido, ou círculo branco, ou mera luz nova que vem,
A lua começa a ser real.
Álvaro de Campos
(FINS DE DUAS ODES, NATURALMENTE)
I
......
Vem, Noite antiquíssima e idêntica,
Noite Rainha nascida destronada,
Noite igual por dentro ao silêncio. Noite
Com as estrelas lantejoulas rápidas
No teu vestido franjado de Infinito.
Vem, vagamente,
Vem, levemente,
Vem sozinha, solene, com as mãos caídas
Ao teu lado, vem
E traz os montes longínquos para o pé das árvores próximas.
Funde num campo teu todos os campos que vejo,
Faze da montanha um bloco só do teu corpo,
Apaga-lhe todas as diferenças que de longe vejo.
Todas as estradas que a sobem,
Todas as várias árvores que a fazem verde-escuro ao longe.
Todas as casas brancas e com fumo entre as árvores,
E deixa só uma luz e outra luz e mais outra,
Na distância imprecisa e vagamente perturbadora.
Na distância subitamente impossível de percorrer.
Nossa Senhora
Das coisas impossíveis que procuramos em vão,
Dos sonhos que vêm ter connosco ao crepúsculo, à janela.
Dos propósitos que nos acariciam
Nos grandes terraços dos hotéis cosmopolitas
Ao som europeu das músicas e das vozes longe e perto.
E que doem por sabermos que nunca os realizaremos...
Vem, e embala-nos,
Vem e afaga-nos.
Beija-nos silenciosamente na fronte,
Tão levemente na fronte que não saibamos que nos beijam
Senão por uma diferença na alma.
E um vago soluço partindo melodiosamente
Do antiquíssimo de nós
Onde têm raiz todas essas árvores de maravilha
Cujos frutos são os sonhos que afagamos e amamos
Porque os sabemos fora de relação com o que há na vida.
Vem soleníssima,
Soleníssima e cheia
De uma oculta vontade de soluçar,
Talvez porque a alma é grande e a vida pequena.
E todos os gestos não saem do nosso corpo
E só alcançamos onde o nosso braço chega,
E só vemos até onde chega o nosso olhar.
Vem, dolorosa,
Mater-Dolorosa das Angústias dos Tímidos,
Turris-Eburnea das Tristezas dos Desprezados,
Mão fresca sobre a testa em febre dos humildes.
Sabor de água sobre os lábios secos dos Cansados.
Vem, lá do fundo
Do horizonte lívido,
Vem e arranca-me
Do solo de angústia e de inutilidade
Onde vicejo.
Apanha-me do meu solo, malmequer esquecido,
Folha a folha lê em mim não sei que sina
E desfolha-me para teu agrado,
Para teu agrado silencioso e fresco.
Uma folha de mim lança para o Norte,
Onde estão as cidades de Hoje que eu tanto amei;
Outra folha de mim lança para o Sul,
Onde estão os mares que os Navegadores abriram;
Outra folha minha atira ao Ocidente,
Onde arde ao rubro tudo o que talvez seja o Futuro,
Que eu sem conhecer adoro;
E a outra, as outras, o resto de mim
Atira ao Oriente,
Ao Oriente donde vem tudo, o dia e a fé,
Ao Oriente pomposo e fanático e quente,
Ao Oriente excessivo que eu nunca verei,
Ao Oriente budista, bramânico, sintoísta,
Ao Oriente que tudo o que nós não temos.
Que tudo o que nós não somos,
Ao Oriente onde — quem sabe? — Cristo talvez ainda hoje viva,
Onde Deus talvez exista realmente e mandando tudo...
Vem sobre os mares,
Sobre os mares maiores,
Sobre os mares sem horizontes precisos,
Vem e passa a mão pelo dorso da fera,
E acalma-o misteriosamente,
Ó domadora hipnótica das coisas que se agitam muito!
Vem, cuidadosa,
Vem, maternal,
Pé antepé enfermeira antiquíssima, que te sentaste
À cabeceira dos deuses das fés já perdidas,
E que viste nascer Jeová e Júpiter,
E sorriste porque tudo te é falso e inútil.
Vem, Noite silenciosa e extática,
Vem envolver na noite manto branco
O meu coração...
Serenamente como uma brisa na tarde leve,
Tranquilamente com um gesto materno afagando.
Com as estrelas luzindo nas tuas mãos
E a lua máscara misteriosa sobre a tua face.
Todos os sons soam de outra maneira
Quando tu vens.
Quando tu entras baixam todas as vozes,
Ninguém te vê entrar.
Ninguém sabe quando entraste,
Senão de repente, vendo que tudo se recolhe,
Que tudo perde as arestas e as cores,
E que no alto céu ainda claramente azul
Já crescente nítido, ou círculo branco, ou mera luz nova que vem,
A lua começa a ser real.
Álvaro de Campos
sexta-feira, 2 de abril de 2010
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