sexta-feira, 16 de junho de 2017

Uma torre, um rosto e a ponte entre ambos

Sandra sabia que um amigo é um irmão que se escolhe.

Roberto não tinha irmãos e lamentava-se…

Ela vivia numa alta torre sem janelas... pelo menos para a rua…

Ele era livre, mas estava preso a uma enorme vontade de conhecer o seu próprio rosto. Sabia que apenas um espelho, um espelho verdadeiro, poderia satisfazer esse seu íntimo e secreto desejo. Para Roberto cada pessoa servia de espelho para as outras e percebia muito bem quando uma pessoa lhe estava a mentir. Depois da primeira desilusão, ele não dava uma segunda oportunidade. Partia em busca do seu verdadeiro rosto noutro espelho e sonhava, em cada nova pessoa que conhecia, encontrar esse mesmo espelho.

Presa na torre, Sandra era livre na sua forma de abarcar o tempo, o espaço e a humanidade. Tinha, na música e na literatura, janelas e portas por onde entrava e saía sempre que as paredes a estreitassem. Num dia em que ela cantava uma música que falava de sorrisos e de feitiços, Roberto passou perto da torre onde ela vivia. Ao ouvir aquela música, quis saber quem a cantava.

Começaram, então, uma longa conversa que não poderia terminar nem que um dos dois morresse porque era tão agradável que, apesar de alguns períodos de silêncio, nenhum se esquecia do outro. Assim, a conversa retomava sempre que o acaso quisesse...

Entretanto, com inocência, com malícia e com muita paciência foram estreitando laços que os tornaram cada vez mais cúmplices.

Com o tempo e a impossibilidade de ver Sandra, pois a torre não tinha janelas para a rua, Roberto decidiu usar a imaginação para criar uma imagem do rosto dela.

Quando terminou a sua obra-prima, olhou-a com espanto ao perceber que era o rosto que ele sempre procurara em todos os espelhos.

Era realmente um rosto extraordinário!


Maria José Meireles 

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