Era uma vez um reino que tinha um Rei e uma Rainha.
Mas não usavam coroa.
No seu reino tinham uma caixa de ver o mundo, mas só o mundo que os outros queriam que eles vissem.
Um dia viram uma rainha de um país muito distante, frio e com nevoeiro, que assistia muito sentada a uma cerimónia.
E tinha uma grande coroa na cabeça.
A coroa era tão grande e tão pesada que a rainha ficava com a cabeça enfiada nos ombros e sem pescoço.
Então o rei e a rainha pensaram, pensaram e, antes que lhes acontecesse o mesmo, resolveram oferecer a coroa ao santo e à santa da sua predilecção.
Assim, o santo e a santa ficaram a ser os padroeiros da nação.
Claro que isso deu mais trabalho aos santeiros, pois tinham de fazer santos e santas com pescoços mais fortes.
O rei lembrou-se que no tempo dos avós e dos pais, todos eles usavam chapéus e, agora, já ninguém usava.
A que santos terão eles oferecido os chapéus que deixaram de ser usados?
Não se lembrava de ter visto santos de chapéu!
O reino era grande: tinha quatro assoalhadas e outros cómodos.
Também convém dizer que havia outras possessões resultantes das conquistas dos seus antepassados.
Essas terras, para além do Rio Este, eram muito distantes, difíceis de gerir e só se lá chegava numa máquina de devorar o espaço.
Mas o reino propriamente dito era muito rico: tinha muitos papéis, grandes árvores até ao tecto e muitas arcas cheias de coisas muito bonitas.
A essas arcas chamam agora caixas de papelão, CD's, prateleiras, DVD's, gavetões e muitos outros nomes.
Como é costume, o reino tinha, como todos os reinos que se prezam, uma entidade superior.
Em alguns reinos é o Sol ou uma grande árvore frondosa, noutros é um crocodilo ou uma formiguinha atarefada ou até uma cigarra cantadora.
Neste reino, o ente supremo era um dragão, com evidentes vantagens.
No inverno aquecia o reino com as labaredas da sua boca.
No verão arrefecia o reino abanando a cauda.
Vivia lá na sua caverna no meio das montanhas.
No entanto havia um problema.
Em casos mais difíceis o dragão tinha de ser consultado.
Mas não era preciso ir à caverna no meio das montanhas porque o dragão andava à vontade pelo reino e só ia para a caverna quando ia dormir: sentia--se mais aconchegado...
Havia outros reinos com quem o rei e a rainha mantinham boas relações de amizade.
E o rei, deste reino, pensou que podia ir às suas arcas e escolher pérolas para oferecer às outras famílias reais.
E eram muitas pérolas: caras de gente feliz, poentes, gaivotas, lagartixas, flores, pedras, troncos de árvore,…
O rei e a rainha começaram a escolher as melhores pérolas para oferecer.
E eram coisas muito bonitas e bem embrulhadas.
Encheram sacos e meteram-nos debaixo dos mantos reais para saírem do reino.
O problema é que, quando o rei e a rainha iam a sair do reino, carregados de pérolas, apareceu o dragão e perguntou: "Que levais debaixo dos vossos mantos?"
Um bocado preocupados com tanta riqueza que levavam para dar, disseram em coro: "São gotas, senhor dragão, lágrimas da natureza".
O dragão quis ver, abriram os mantos reais, e o que se viu?
Eram mesmo gotas, pingos de chuva, lágrimas da natureza.
E foi por isso que as outras famílias reais receberam de presente gotas, apenas gotas.
Alf. Dez. / 2015
(texto impresso e editado, com a devida autorização do dragão, aos 6 dias do mês de dezembro do ano de 2015)
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